20070323

História de Portugal (muito resumida)

Tudo começou quando um gajo, para que não lhe chamassem menino da mamã, resolveu distribuir porrada pela família e criar um país só para ele, a que chamou Portugal. A uma dada altura os portugueses foram à Índia buscar pimenta e pelo caminho descobriram o Brasil. Depois vieram os subsídios da CEE.

Bíblias nos quartos de hotel

Não percebo esta história das bíblias nos quartos de hotel, sendo Portugal um país laico. Há ainda um pormenor curioso: na maioria das vezes nem sequer é a bíblia completa, trata-se apenas do Novo Testamento. Já que não colocam o Alcorão ou a Tora, ao menos colocavam também o Antigo Testamento, sempre era mais democrático.

Se tivesse o Antigo Testamento, talvez eu desse uma vista de olhos, aquilo está cheio de guerras, sangue e cataclismos. Agora o Novo Testamento é só paz e amor, não gosto muito. Se calhar é porque não gosto de histórias em que o artista morre ao fim. Eu sei que ele depois ressuscita e diz algo do género “I´ll be back”, mas, passados 2000 anos, ainda estamos à espera da sequela.

Ainda se fosse nos Estados Unidos, podíamos sempre argumentar a tese da conspiração e dizer que as bíblias estavam lá porque continham microfones secretos para nos espiar. Só a hipótese de as bíblias poderem conter microfones no seu interior já revela uma verdade universal: ninguém lê uma bíblia num quarto de hotel. Se o pessoal já leva toalhas, sabonetes e champôs para casa, imaginem o que era depararem com um Sony no interior da bíblia…

Já estou a imaginar a lógica da coisa: Portugal é um país maioritariamente católico e é simultaneamente muito religioso e muito esquecido. Quer ler e rezar sobre a bíblia todas as noites, mas sempre que vai de viagem esquece-se de a pôr na mala. Estou-me a lembrar de muitos artigos que às vezes me esqueço de pôr na mala, mas nunca me esqueci da bíblia.

A única explicação é que se trata de uma conspiração de Paços de Ferreira: as bíblias já vêm com os móveis quando os hotéis são construídos. Quando alguém repara já é tarde. Mesmo eu, um ateu convicto, teria relutância em atirar o livro sagrado para o caixote do lixo. Por isso lá fica, faz parte (literalmente) da mobília.

20070308

A lei do referendo é matematicamente não vinculativa

Decidi deixar passar tempo suficiente para que o tema não estivesse tão emocional, para falar deste assunto. E vou usar os resultados do último referendo, para ilustrar a necessidade dos governos terem alguém que perceba de matemática para consultar, antes de mandar cá para fora autênticos disparates.

É que isto de colocar licenciados em direito a mexer com números tem destas coisas: o resultado final da lei é muitas vezes contraditório em relação ao próprio espírito com que a lei é criada.

Um referendo para ser vinculativo deve ter a participação de pelo menos 50%+1 eleitores. Esta é a primeira estupidez: se o número de eleitores for ímpar, por exemplo 8.000.001, quantos eleitores são 50%? 4 Milhões e meio? OK, arredonda-se. Para 4 Milhões ou para 4 Milhões e um? Se utilizarmos as regras da matemática, em números inteiros, metade de 8.000.001 são 4.000.001. Então, neste caso, o referendo para ser vinculativo deveria ter 4.000.001+1 eleitores, ou seja 4.000.002. No entanto, todo a gente está de acordo que 4.000.001 eleitores bastariam, porque é superior a metade dos eleitores. A probabilidade de um cenário destes é quase nula (está ao nível quântico) mas cria, em teoria, a possibilidade da existência dum eleitor do queijo Limiano.

Imaginem o que seria esta regra transposta para as organizações mais pequenas, com 3 ou 5 sócios. O que salva a lei do referendo, é outra lei, bem mais abrangente, a lei dos grandes números.

Afinal, o que tem o referendo a ver com isto?

O número de eleitores oficiais à data do último referendo era de 8.832.628. Para ser vinculativo bastariam votar 4.416.315. Se tivessem votado estes, bastaria que um dos lados tivesse 2.208.158 votos para passasse a ter força de lei. O SIM teve 2.238.053 votos. Ou seja mais 29.895 votos que o necessário. No entanto não teve decisão de lei. E porquê? Porque não votaram um número suficiente de adeptos do NÃO.

Faltaram 564.702 votantes para o referendo ser vinculativo. Se todos estes tivessem ido votar e tivessem votado NÃO, os resultados seriam os seguintes:

VOTANTES: 3.851.613 + 564.702 = 4.416.315 (50%+1)

SIM: 2.238.053 + 0 = 2.238.053

NÃO: 1.539.078 + 564.702 = 2.103.780

O SIM teria ganho de forma menos expressiva, mas seria vinculativo. Assim, porque os nossos deputados não percebem nada de Matemática, ainda se anda às voltas na Assembleia a discutir o que já devia estar decidido.

20070302

A hiper-identidade nacional

Vem este post a propósito de um comentário anterior, que desde já agradeço. E escrevo-o porque se trata de um dos meus assuntos preferidos e com que costumo chatear a paciência dos meus amigos: a identidade nacional. Não sei se partilha da mesma opinião, mas o(a) autor(a) faz referência a Eduardo Lourenço, que advoga que “temos uma hiper-identidade nacional fortíssima que nos manteve sempre unos e sem indícios de separatismos”.

Longe de mim discordar de tão brilhante pensador, mas o que ele diz não é novidade nenhuma. Se fizermos a pergunta a 100 “pensadores”, pelo menos 99 e meio estarão de acordo com ele. O meio pensador é só para esta sondagem mental estar dentro do intervalo de confiança.

Só existe um problema: eles estão errados!

Para o Sr. Eduardo Lourenço só tenho uma palavra: Olivença. Aquilo foi português durante 504 anos e, à falta de melhor palavra, foi ocupada pelos espanhóis em 1801. Até hoje. E os 206 anos de ocupação criaram, para usar as palavras de Eduardo Lourenço, “uma hiper-identidade nacional fortíssima que os manteve sempre unos (a Espanha) e sem indícios de separatismos”.

Aliás, é a primeira vez que vejo uma hiper-nacionalidade originar ausência de indícios de separatismo. Deve ser mais uma originalidade portuguesa. Já conhecia as hiper-nacionalidades separatistas dos bascos, dos irlandeses, dos croatas e dos sérvios, até dos sicilianos e dos corsos. Agora também temos que colocar nos compêndios a hiper-nacionalidade light, tipo “a que país pertencemos? Portugal? Pode ser”. Parafraseando a Floribela, essa grande pensadora dos nossos dias, temos uma nacionalidade hiper-mega-super.

Haveria muito mais para dizer acerca do assunto, mas o texto tornar-se-ia demasiado extenso. Voltarei ao assunto, quando tiver oportunidade. Entretanto deixo a porta aberta para receber outras opiniões, especialmente o meu amigo de terras de sua majestade. São sempre bem-vindas. Quem sabe, até posso mudar de opinião, afinal sou português…

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Post Scriptum

Deixo aqui o que escrevi em Dezembro a propósito do tema:

Mas que raio de identidade existe nos portugueses? Um algarvio de Monchique tem tanto a ver com o galo de Barcelos como um maori com uma rena da Lapónia. Por muito que me custe dizer isto, há muito mais de “identidade” lusitana no Eusébio e na Amália (e não estou a falar das lontras do oceanário) que nas obras do Saramago ou nos discursos do Cavaco. Acho mesmo que devíamos adoptar o Eusébio e a Amália como símbolos nacionais – agora estou a falar das lontras. Querem algo mais português que um casal de lontras a ser visitado por turistas e alimentado pelo Orçamento de Estado?