20070129

As três instituições nacionais

Já a minha avó dizia que existiam três instituições em Portugal: a inveja, a má-língua e o crédito mal parado. Passadas duas gerações, uma mudança de regime, o fim do império colonial, uma integração europeia e uma mudança de milénio, pouco ou nada mudou.

Analisando friamente, estes três aspectos da sociedade portuguesa estão interligados. Se não, vejamos.

Suponhamos que o meu vizinho decide adquirir uma viatura topo de gama que faz questão de estacionar frente à minha janela só para me provocar. Isto vai despoletar uma série de acontecimentos.

1º - Inveja

Este facto vai originar em mim um desejo irrepreensível de também trocar a minha carripana a cair de podre que escondo a três quarteirões de distância. Faço as minhas contas e chego à conclusão que para adquirir uma viatura igual teria que trabalhar 147 anos. Portanto, se eu não consigo comprar, ele também não pode conseguir. Só se for através de meios fraudulentos.

2º - A má-língua

Estou-me nas tintas se foi através do trabalho, da poupança, do totoloto ou doutro meio legal qualquer. O gajo deve andar a fugir aos impostos, a passar facturas falsas ou, pior ainda, a passar droga. Inocentemente, deixo escapar este comentário no café da esquina. De preferência começo a frase por “diz que…”. O sujeito impessoal da frase tem um efeito avassalador. Não foi alguém que me disse. Não. Diz que. É Vox populi.

A partir de agora não adianta ao meu vizinho argumentar que foi uma tia rica da Venezuela que lhe deixou uma herança. Ninguém acredita. Ninguém bate o “diz que”. O melhor é ele começar a procurar nova casa e ir pregar para outra freguesia.

3º - O crédito mal parado

Graças à patriótica estratégia da nossa banca, que prefere emprestar 50.000 euros a um particular para consumir que 10.000 a uma empresa para investir, eu também posso adquirir uma máquina como a do meu vizinho.

O Banco diz-me que o spread isto, a Euribor aquilo, eu não percebo nada mas como estou isento da primeira prestação, aceito e depois logo se vê. Muito portuguesa esta expressão do depois logo se vê, deve-nos estar nos genes desde o tempo dos descobrimentos. Não admira que o povo português seja o povo mais endividado da Europa.

È que, historicamente, nós nunca produzimos nada. Depois das especiarias da Índia, do ouro do Brasil, dos escravos de África, das remessas dos imigrantes, dos subsídios da Europa e do dinheiro dos turistas, temos o crédito da banca.

Epílogo

O mais curioso da história é que, afinal, o meu vizinho também se endividara para adquirir o seu carro, porque não podia ficar atrás do calão do Ernesto, seu colega de trabalho.

20070126

Publicidade nojenta

Inicia-se aqui uma nova rubrica, intitulada “Publicidade nojenta”. Tem a honra de abrir esta rubrica, o anúncio televisivo do BES 10.8%.

Confesso que me faltam as palavras para dizer o que penso acerca do assunto. Não sei se hei-de lamentar a falta de gosto do BES ao esfregar nas fuças dos portugueses a riqueza de uns quantos, ou se deveria antes comemorar a sua honestidade, ao bradar em prime time a lógica da sua política comercial.

E eu que pensava que era impossível bater o spot do Joe Berardo / American Express…

20070124

Devolvam o dinheiro

Vem aí mais uma batelada de euros dos nossos amigos europeus. Agora é que é a última oportunidade. Depois do QCAIII já ter sido a última oportunidade.

Se tivéssemos um pingo de vergonha na cara, tínhamos dito que não queríamos o dinheiro e que o dessem à Roménia ou à Bulgária. Mas não temos um pingo de vergonha. Nem de inteligência.

Depois de vinte anos de ajudas, ao ritmo de um milhão de contos por dia, conseguimos passar de 10º para 20º no ranking do desenvolvimento económico. É obra!

20070109

iPod 2007, R.I.P.

Sempre me fez alguma impressão, os maluquinhos do MAC. Que o sistema é melhor que o Windows não tenho dúvidas. Aliás foi através de um MAC que entrei no mundo dos computadores, há vinte anos atrás.

Agora que digam que estão a combater a ganância e a chulice do Bill Gates também já é demais. A chulice do Bill Gates, apesar de tudo, permitiu que os preços baixassem ao ponto de podermos usar um PC como suporte de prateleiras sem remorsos. Experimentem fazê-lo com um MAC. O engraçado é que 90% dos utilizadores do MAC que eu conheço têm baixo poder aquisitivo e fazem um esforço para combater o demónio Bill Gates em prol do anjo Steve Jobs. Há mesmo quem utilize o MAC para ouvir mp3, porque o som sai com melhor qualidade. Esta é de rir. Consegue-se praticamente a mesma qualidade de som raspando um pau de giz contra um quadro de lousa (peço desculpa aos mais sensíveis que agora ficaram com o ruído na cabeça). Se o mp3 apareceu e se propagou com a velocidade com que o fez, não foi pelas suas qualidades melódicas. Será que estamos a ficar duros de ouvido com tanta poluição sonora?

O PC é uma amante, o MAC é uma esposa

A principal diferença é que ter um MAC é como um casamento. Fazer o upgrade ou trocar pelo último modelo é quase tão caro como um divórcio. Com o PC não. Encaramos aquilo como uma aventura de fim-de-semana, quando muito um namoro passageiro. Quando estamos fartos, cada um vai à sua vida. Outra vantagem do PC é que ele também não tem nenhuma fidelidade para connosco e quando a relação começa a azedar, ele põe ponto final na relação: crasha sistematicamente, apanha vírus ou perde inexplicavelmente gigas de informação da qual não tínhamos backup.

Conheço muita gente que tem dois PC’s sem qualquer problema de consciência. Não conheço ninguém que tenha dois MAC’s. Mesmo quando são obrigados a usar PC no emprego sentem problemas de infidelidade.


A Maçã e o fim do Paraíso

As razões da escolha do MAC tem mais a ver verdadeiramente com um espírito de rebeldia que qualquer outra coisa. Depois vem a qualidade, a fiabilidade, blá, blá, blá,… Serve apenas de desculpa. No entanto, o anjo Steve Jobs tem asas de barro. Afinal ele não é um Che Guevara, é um Fidel Castro.

Os sinais foram sendo fornecidos aos poucos. Quando comecei a ver pessoas a comprarem MAC porque havia em verde, pensei que era altura de fugir a sete pés. Depois apareceu aquele Office para MAC com os ícones amaricados. Era a gota final. Agora até os adeptos fervorosos do MAC enriqueciam o tio Bill. Como se isso não bastasse, Steve Jobs decidiu colocar processadores Intel o que vai fazer com que, com o tempo, o seu sistema operativo se pareça cada vez mais com o Windows.

Fairplay para quem?

A prova derradeira é o sistema Fairplay (reparem no cinismo da expressão). Este sistema impede que o iPod reproduza músicas que não sejam descarregadas através do iTunes. Mais ainda, impede que as músicas do iTunes sejam reproduzidas noutros leitores. Isto permitiu ao iPod e ao iTunes terem, nos EUA, uma quota de mercado de 75% e de 88% respectivamente. O aluno bate o mestre. Ao menos o Bill Gates tem o queijo mas distribui as facas. Pelos vistos os monopólios são permitidos desde que não sejam da Microsoft. Por muito menos o Internet Explorer e o Win Media Player tiveram que sair do pacote do Sistema Operativo Windows porque era concorrência desleal.



DVD Jon – Parte 2

Jon Lech Johansen é um norueguês de 22 anos que em 1998 ficou conhecido por conseguir crackar o sistema anti-cópia dos DVD, facto que originou a sua alcunha. Contratado pela Double Twist, concebeu um software que consegue contornar o Fairplay. A empresa prepara-se para o distribuir em 2007 e a concorrência da Apple e os consumidores agradecem. Será que o caso acaba em tribunal? Veremos.